Com as (rui)barbas de molho....



Eu tenho uma amiga muito querida aqui em Trondheim, uma mexicana, que como eu veio para o exílio no barco do amor. Minha amiga está terminando a escola de culinária e acabou de voltar de um estágio na Espanha de onde me trouxe uns presente muito especiais. Entre outras coisitas não comestíveis eu ganhei uma lata de páprica defumada e torinhas de chouriço espanhol. Eu fui visita-la enquanto nossas crianças estavam na escola, tomar café, ouvir as novidades de sua estada na Espanha e voltei para casa carregada de delícias. Além da páprica defumada e do chouriço eu ainda trouxe para casa um imenso bouquet de ruibarbos ( ruibarbos escritos com "O", claro, perdoem-me pelo trocadilho do título) colhidos no jardim da casa da minha amiga...




Minha amiga mexicana é uma cozinheira entusiasmada, apaixonada pela cozinha do oriente médio, mas detesta ruibarbos, não os entende. O mais curioso é que essa mesma amiga não pode ver um vaso com cactus num canto qualquer que, na mesma hora, sente uma vontade imensa de comer cactus. Os ruibarbos do imenso arbusto que cresce livre todos os anos no jardim da casa dessa amiga, devoradora de cactus, morriam de velho todos os anos até que um dia eu, e nossa amiga japonesa, aquela mesma que me traz farelos e pós de peixe de Tóquio, resolvemos intervir e salvar os ruibarbos do abandono. Agora, todos os verões, nós duas fazemos a festa nos últimos anos, sob nossa influencia, nossa amiga mexicana já usa o ruibarbo no trabalho, mas ainda não conseguiu aceitar esse vegetal totalmente em casa.




Eu fui doutrinada na filosofia do ruibarbo ao longo dos anos, aos poucos e não foi de uma hora para outra que achei graça naqueles talos cor de rosa. Durante muito tempo achei que o uso do ruibarbo deveria ficar restrito aos chás e fitoterápicos. Aprendi a gostar de chá de ruibarbo com uma ex-chefe, durante minha passagem pelo jornal Valor Econômico. Minha chefe, uma gaúcha de origem alemã, e uma senhora bon vivant me apresentou e conseguiu me deixar dependente do chá de ruibarbo que ela bebia nas tardes frias de São Paulo. Ela bebia (bem, ainda bebe) chá todos os dias e eu então passei a tomar chá de ruibarbo com baunilha todas as tardes na redação do Valor Econômico.




Naquela época eu voltava da licença maternidade, já tinha tido bebê mas o enjôo de café trazido pela gestação ainda não tinha passado e eu me jogava no chá de ruibarbo que minha chefe trazia de uma loja de chás no shopping Iguatemi. Será que ainda existe essa loja? Depois que mudei para cá, em função da abundância de ruibarbos, comecei cozinhar com eles com bastante frequência. Gosto de fazer geléia e gelatina de ruibarbo e aprecio bastante os resultados. A gelatina, como todas as gelatinas feitas em casa, fica uma maravilha e as crianças adoram comer com iogurte de baunilha e morangos picados. O sabor da gelatina de ruibarbo é de fato único, uma mistura de sabores conhecidos com um sabor de fundo totalmente desconhecido. Eu diria que é uma mistura de salsão com maça, morango, cerejas e casca de maracujá roxo.




O ruibarbo é um "arbustinho" lindo, com folhas imensas de um verdes profundo que parecem couves mas que não podem ser consumidas por conterem ácido oxálico uma substância altamente tóxica. As raízes do ruibarbo também são tóxicas. Do ruibarbo só devem ser consumidos os talos de forte perfume mas intenso sabor azedo. Os talos tem um cor vermelha linda e a gelatina de ruibarbo adquire uma cor de rosa linda, enquanto a polpa perde a cor depois que o suco é drenado, mas o sabor permanece intenso. A polpa cozida e adoçada pode ser usada para compotas, tortas, geléias e outras finalidades enquanto o líquido é usado na gelatina.





Gelatina de ruibarbo

1 kg de talos de ruibarbo sem folhas, lavados e cortados em rodelas
450 gramas de açúcar
200 ml de água + 100 ml para dissolver a gelatina
4 colheres de chá de gelatina em pó sem sabor


Como:

Coloque o ruibarbo lavado e fatiado numa tigela, adicione o açúcar e misture bem para espalhar o açúcar em todos os pedaços. Adicione a água, mexa um pouco mais. Transfira tudo para um tabuleiro refratário e leve ao forno pré-aquecido a 180C por cerca de 30 minutos ou até que os ruibarbos estejam bem macios. Deixe esfriar e passe o conteúdo pela peneira para um jarra medidora. Confira a quantidade de líquido antes de definir a quantidade de gelatina (ou agar agar) a ser usado. Eu uso 1 colher de chá de gelatina em pó para cada 200-250 ml de líquido, mas eu não gosto de gelatinas duras demais, gosto que elas fiquem meio molengas, balançando depois de desenformadas. Como eu obtive 900 ml de líquido eu usei 4 colheres de chá. Se fosse usar folhas usaria umas 4 a 5 folhas. Se você estiver insegura confira as instruções do seu fabricante de gelatina.

Coloque cerca de 100ml de água fria numa xícara, salpique a gelatina e deixe o pó amolecer e crescer por uns cinco minutos. Enquanto isso ferva metade do suco de ruibarbo drenado até ferver, retire do fogo e adicione a gelatina amolecida em água fria e mexa vigorosamente até que a gelatina derreta totalmente. Misture o suco fervido com a gelatina ao restante do suco frio e misture para incorporar. Divida o líquido em potinhos de vidro ou taças, deixe esfriar e leve para gelar.

Rende de 6 a 8 porções de gelatina.

Obs. Desta vez eu não desenformei as gelatinas, coloquei-as para gelar em potes de vidro com tampa. Na hora de servir adicionei uma bela colherada de iogurte de baunilha com baixo teor de gordura e servi com morangos picados para as crianças. Eu e Per comemos a nossa gelatina com parte da compota de ruibarbo que depois foi usada na torta de ruibarbo e maça.





Torta de Maça e Ruibarbos


Massa:

Receita reduzida de receita original do Olivier Anquier, para conferir receita original clique aqui:

250 gramas de farinha de trigo
100 gramas de manteiga fria (com ou sem sal, use o tipo que preferir)
uma pitada de sal
35 gramas de açúcar
75 ml de leite

Recheio:

500 gramas de compota de ruibarbo e maça


Como:

Numa tigela misture a farinha, o sal e o açúcar. Pique a manteiga ainda fria, mas não super dura, em cubos pequenos e adicione a mistura de farinha. Usando a ponta dos dedos misture bem com amassando os cubos de manteiga até formar uma massa esfarelada, como farofa. Adicione o leite frio, aos poucos, mexendo até formar uma massa homogênea, super macia. Enrole num filme plástico ou coloque num saco e leve a geladeira por meia hora. Na hora de assar abra a massa até forma um circulo com diâmetro de cerca de 30 a 35 cm com 2 a 3 mm de espessura. Coloque a massa numa forma grande forrada com papel manteiga. Coloque o recheio, a compota de maças e ruibarbo, no centro da massa, usando uma espátula para nivelar o recheio. Deixando uma borda de massa, com cerca de 5 cm, sem recheio. Dobre a borda tendo o cuidado para formar algumas pregas nas curvas para manter o círculo da torta. Leve para assar por cerca de 25 a 30 minutos ou até que a massa esteja cozida e levemente dourada.

Serve 6 a 8 pessoas





Compota de ruibarbos e maça


600 gramas de polpa de ruibarbo fria mas cozida em água e açúcar
4 maças grandes descascadas e picadas
4 colheres de sopa de açúcar de baunilha
3 colheres de sopa de água

Como:

Numa panela pequena de fundo grosso coloque as maças picadas, o açúcar e a água e deixe as maças cozinharesm até ficarem macias. Adicione a polpa de ruibarbo já cozida a polpa de maça, aos poucos, mexendo suavemente para incoporar as polpas sem amassa-las demais. Quando a mistura começar a ferver abaixe o fogo e deixe cozinhar por cerca de 3 a 5 minutos. Retire do fogo e deixe esfriar. Coma com queijo, torradas ou use como recheio para uma torta tipo galette.

Comentários

Susana Gomes disse…
Acho que ainda não será esta estação que provarei os ruibarbos, mas guardei todo o posto para quando chegar a hora.
Já tinha visto a gelatino e tinha adorado o resultado: que cor linda!

E não resisti à expressão: "veio para o exílio no barco do amor". :)

Beijinhos :)
Gina disse…
Festival de ruibarbo, que nunca comi, sequer vi pessoalmente...
Ficaria tentada a usar as folhas, não sabia que eram tóxicas.
Sua menina já tinha visto outras vezes, mas o menino não. Que fofos! E estão provando que gostam mesmo de ruibarbos!
Amigos têm o "dom" de agradar com esses mimos, que tanto bem fazem à nossa alma, não?
Bjs, Cláudia!
Claudia Lima disse…
Aqui os ruibarbos são bastante populares, mas nunca provei. Sempre tive receio de comprar e não gostar do paladar. Entretanto, tenho bastante curiosidade.
Eu não sabia que as raízes e folhas são tóxicas. É uma informação importante.
A cor da gelatina fica realmente linda e a torta rústica deve ser muito boa tb.
É muita sorte de vcs poderem aproveitar estes ruibarbos tão fresquinhos.
Bjs :)
Glau disse…
Querida, passei pra te deixar um beijão...

minha amiga está ai na Noruega.. pertinho de vc! Tentei falar com ela ontem no msn, mas não consegui! :(

Sua filhota cresceu...
Bjao, Glau
Muito interessante seu blog...amei!
Já estou te seguindo.
Seja muito bem vinda ao meu:
http://myblogsaborear.blogspot.com/
Dani disse…
Há um tipo de ruibarbo aqui que é produzido o ano inteiro, não me lembro do nome...
Adoro "rhubarb crumble", com muito creme de bauilha quentinho, é uma das minhas sobremesas favoritas.
Outro dia fiz como compota - um xarope ao fogo, desliguei, e coloquei os pedacinhos, que cozinharam direto no calor do caramelo. Assim, ficam uma delícia com iogurte, já que o doce extremo precisa de um contraste.
Maçã e ruibarbo é uma combinação ótima para o crumble, e imagino que a torta tenha ficado tão boa melhor - quanto.
Beijos!
Luciana disse…
Nunca provei o tal ruibarbo, na veerdade não tinha nem nocão do nome, mas já vi esse vegetal antes. O visual fica lindo, uma cor maravilhosa, deve ser uma delícia também.
Aprendendo com seu blog!
Beijo
Unknown disse…
Adoro ruibarbo, tento sempre fazer receitas diferentes com ele. Por acaso nunca fiz gelatina nem compota. Mas estas receitas não me escapam.

Beijinhos
Claudia disse…
Suzana,

Aqui os ruibarbos seduzem pois contam histórias destas terras de limitados recursos naturais, se destacam diante de pouca opção, mas não iriam encantar multidões em cenários onde a natureza é mais generosa e mais diversa... Mas se colocares as mãos neles aproveite.

Gina,

Os amigos são a melhor coisa da vida, eu diria. Nossas família escolhida. Sabe que as crianças adoram gelatina e comem de qualquer sabor... até mesmo de ruibarbo.

Clauzinha,

Os ruibarbos são bem azedos e pedem uma quantidade razoavel de açúcar na hora de cozinhar. Mas não deixe de experimentar se encontrar no jardim de algum amigo por aí, mas não compre pois os comercializados são em geral bem piores...

Glau,

Coitada da tua amiga, deve estar perdida. O verão aqui será o pior dos últimos anos e ela vai tomar um choque... Diga para ela me procurar!

Taís,

Obrigada! Vou visitar-te assim que puder!

Dani,

Esses ruibarbos do jardim da minha amiga são maravilhosos e vale a pena uasr, mas há ruibarbos verdes horríveis e não sei se são esses que nascem o ano todo. Sim, concordo, em parceria com maças eles ficam bem melhor, ou com morangos. Mas o suco gelatinado fica uma delícia.

Lu,

Aqui na região há ruibarbos em praticamente todos os jardins e eles florescem que é uma beleza e dão uma flor que é super linda. Aí também deve ter bastante, mas o povo aqui quase não colhe, como sempre, deixam tudo estragar nos pés...

Cacahuete,

A cor da gelatina de ruibarbo é um atrativo a mais na hora de escolher o que fazer com eles.

Beijos para todas!


Cláudia
Camila Hareide disse…
Por aqui tem ruibarbo pacas, mas eu ainda não aprendi a domá-los... Fiz uma vez e achei a compota bem sem graça, apesar de adorar um sorbet de ruibarbo com morangos que servimos no hotel...

A loja de chá no shopping Iguatemi anda existe, e tem uma filial no shopping Villa Lobos. A dona era amiga de meu pai, que fez assessoria de imprensa pra eles por um tempo... Chás absolutamente divinos!

Um dia vou aprender mais sobre os ruibarbos sobre os quais li a vida toda e esperava um mundo mais de coisas! Dá pra começar com seu post!

Ah, semana passada fiz uma receita de pão de centeio que você publicou faz teeeeeempo, o pão do Outback. Ficou ótemo!

beijo
Isabel disse…
Cada vez fico mais curiosa em relação ao ruibarbo. Nunca provei pois por aqui não encontro, mas que faz delícias, isso está mais do que comprovado por estas belíssimas fotos!
Beijinho.
Claudia disse…
Camilitcha,

Ruibarbo puro não tem graça nenhuma, tem que lascar açúcar para rebater o azedume e adicionar alguma outra fruta mesmo. Com morango fica um parzinho e tanto. E acho que por isso que os "norugas" deixaram de come-los pois a oferta de frutas aumentou e eles agora deixam os ruibarbos florirem...

Não mencionei, mas a tal assessora e imprensa que trabalhou para teu pai dera a minha chefe que em 2000, quando o Valor foi lançado, assumiu no jornal e ela então passou a sociedade na loja de chá adiante...
Ela era dona da loja que chamava Terlander e depois mudou de nome. O mundo é pequeno, fia!

Isabel,

Se não há ruibarbo por aí não esquente muito pois não, sinceramente, ruibarbo não vale o esforço de comprar. Ruibarbo só é bom quando já está lá, quando se pode colher no jardim do vizinho, ou plantar no seu próprio jardim pois é vegetal azedo e com sabor bem complexo que não chega a ser unânime....

Bjs,

C.
Nina disse…
Muito bonito esse post, especialmente as fotos dos seus filhos.

Ruibarbo, pra mim, é coisa de livro... Quem sabe um dia tenho a oportunidade de provar?

Beijo
Jane Rodrigues disse…
Só pra informar, o shopping Iguatemi ainda existe sim, sempre vou lá.

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